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terça-feira, 2 de março de 2010

Virginal Diarística


Na edição do “Correio da Manhã” de 28 de Fevereiro, descubro, em coluna à esquerda da página 52, o “Diário de Margarida”, ante-intitulado “Olhar de Uma Virgem”. É assinado por uma donzela chamada Margarida Menezes, que já foi até notícia, por mais que uma vez, na televisão.
Não quero deter-me no conteúdo desta diarística, embora nela reconheça uma singularidade digna de nota, do ponto de vista literário: a autora propõe-se, neste espaço, relatar o quotidiano de uma vida onde não se passa nada. Ou, pelo menos, onde não se passa nada que nos interesse.
O que aqui prefiro sublinhar é a circunstância de, hoje, um jornal importante pagar pela crónica de uma virgem de (arrisco) trinta anos.
No século XVIII, as confissões dos condenados de Newgate (Inglaterra) eram “best-sellers”: aí se exaravam terríveis crimes e pecados, do mais humilde furto à grande vigarice e à mais sofisticada luxúria. No final, os confessos manifestavam o convencional arrependimento e encomendavam as almas a Deus.
Os leitores de então, esses, no recato estrutural de meras testemunhas do escândalo, deleitavam-se com aqueles relatos, vivendo a sua quota-parte de vício, mas sem culpa. Voyeurs, como todos os bons leitores de narrativa. Assim temperavam de extraordinário a vida ordinária (i.e., vulgar) onde geralmente residiam.
Hoje, passa-se o mesmo, no fundo. Mas o “extraordinário” é, agora, haver uma virgem com (arrisco) 30 anos; e o “ordinário” é o que se sabe, ou, na minha provecta idade, o que se imagina.

Ribeira de Pena, 02 de Março de 2010.
Joaquim Jorge Carvalho

7 comentários:

Anónimo disse...

Virgo assim mêmassério? Num macredito.

Cão

Joaquim Jorge Carvalho disse...

Mêmo mêmo, não sei... Custa a crer, não é? Hei-de ver.
S. Tomé

dromofilo disse...

Só resta saber, caros amigos, se é uma virgem que faz muito caso do tempo, ou não.

Paulo Ferreira

Joaquim Jorge Carvalho disse...

Curiosamente, Thoreau escreveu um poema versando justamente as virgens que, por tanto adiarem o amor, ficam sem tempo. O texto aparece no filme de Weir, "Clube dos Poetas Mortos".
Abraço, Paulo!
JJC

Daniel Abrunheiro disse...

Eu tenho feito por lá ir.

Nelson disse...

Viva.
Realmente custa a crer!!! Nos dias que correm...
Só um pequeno apontamento: o poema a que te referes [As virgens que fazem muito caso do tempo] não é de Thoreau, mas sim de Robert Herrick:

"Gather ye rosebuds while ye may,
Old Time is still a-flying;
And this same flower that smiles today
Tomorrow will be dying."

Abraço.
Nelson

Joaquim Jorge Carvalho disse...

Tens razão, Nelson.
Eu retivera (erradamente e à distância) a ideia de que, no filme, "tudo" o que Mr. Keating visitava era Thoreau, Whitman e Shakespeare. Mea culpa - e obrigado!
Abraço.
JJC