Bússola do Muito Mar

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Número de Ondas

sábado, 22 de junho de 2013

Quadra fraquinha, mas sincera, sobre o Verão amado


Eu te saúdo, ó virgem Verão
Presente novo que ainda vi!
Quem me dera, Irmão, que não
Te fosses nem eu de ti!

Ribeira de Pena, 21 de Junho de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho

quinta-feira, 20 de junho de 2013

A luta. As lutas. (Ou Junho indignando-se contra o avesso de Abril)


Conversa à porta da Escola, há cerca de uma semana. A luta dos professores. As lutas em geral. Disse, então, algo. Direi-escreverei agora um pouco mais (ou reglosarei o mesmo, quiçá mais claramente).
Nisto de lutas, nem sempre o mais importante é o mais óbvio. O essencial, às vezes, nem sequer é visível, a olho nu.
A luta dos professores é pelo emprego, sim. É pelas condições de trabalho, sim. Mas é também – e sobretudo – pela Escola Pública que Abril prometeu e, até certo ponto, cumpriu. Pelo Futuro que falta.
Disse-o, há dias, a um ex-aluno, hoje na universidade. A luta é por manter uma Escola a que ele teve, no seu tempo, direito e a que, se os circunstanciais governantes (estes ou outros) forem deixados à rédea solta, os vindouros já não terão.
É, aliás, por isso que a passividade, a indiferença e o cinismo fazem parte, na minha gramática mental, de um mesmíssimo holónimo: o nojo.  

PS: Aproveito para cumprimentar os milhares de professores que, nas suas Escolas, se organizaram para, até – pelo menos – ao dia 19 de Junho, fazer ouvir a sua voz, a sua preocupação, a sua (incalável) exigência de dignidade e justiça.

Ribeira de Pena, 20 de Junho de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho
[A foto, colhida na internet, é de um grande herói da Humanidade, Martin Luther King.]

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Crase (Auto-epitáfio esdrúxulo e razoavelmente prévio)


Pífio fui. E cândido. E ínfimo. Decerto mínimo
Dos mínimos.

Mas também ávido. E lúcido. E único. Decerto máximo
De mim.          

Vila Real, 16 de Junho de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho
[A foto foi colhida, com a devida vénia, em http://www.maximoferreira.livejournal.com.]

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Casa necessária


 

Às vezes é preciso começar
A casa pelo telhado –
Tecer o que falta só depois
Até chegarmos ao certo solo
Até colocarmos a porta
Até sairmos para a rua chã.
Na poesia, por exemplo, já tive
Casas que nasceram assim
De uma ideia em altura
De mim, enfim, sobre a telha
Calcária, vária e solidária
Anterior à casa necessária.
 

Ribeira de Pena, 07 de Junho de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, em http://www.mundodastribos.com.]

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Tempo

A mulher, ainda jovem, corre rua acima com o filhote pela mão. Não sei dizer para onde vai, por que razão corre assim. Mas vejo o que vejo: um corpo gracioso agitando-se, sob o movediço e leve embrulho de um vestidinho amarelo. Pernas esguias e ágeis equilibrando-se dificultosamente sobre saltos altos. Quadris saudáveis moldando-se àquele frágil têxtil tão à espera (especulo) de ser tocado.
O petiz quer um gelado. A mãe recusa, puxa-o, explica-lhe:
- Não tenho tempo, filho.

Mas tinha. Mas tem.

Ribeira de Pena, 06 de Junho de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, em http://www.dolivrinho.blogs.sapo.pt.]

terça-feira, 4 de junho de 2013

Vice & versa


Vai-se de nada ao amor e vice-versa
Sempre a descer, sempre a sofrer.
A gente morre e torna a nascer
E morre de novo (o resto é conversa).

Ribeira de Pena, 04 de Junho de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem é do cartaz do (grande) filme Thelma & Louise, com a maravilhosa Geena Davis e a interessante Susan Sarandon.)

Sonolência

Café de vila. Um velho dormita frente ao jornal. Uma mulher (esposa do adormecido) fala do passado com um outro homem, claramente mais novo do que o casal. Ouço tudo, de forma involuntária ao início, despudoradamente voluntária a seguir. O interlocutor da velha sai do Café, com mesuras amáveis. A velha acorda o marido. Pergunta-lhe se se lembra do Rui. Do filho do Antunes, que estudou para médico. O velho lembra-se.
- É muito bom rapaz. Nunca mais o vi.
A esposa diz-lhe que o Rui Antunes ali esteve e que já saiu. "Tinha pressa, coitado."
- E tu não me acordaste, porquê? - resmunga o velho.
- Para quê? - atira-lhe a mulher. - Estavas a dormir tão bem...
O velho encolhe os ombros e regressa às sonolentas notícias do dia.
Penso: talvez aquele velho nunca mais tenha a oportunidade de ver o tal médico.
Penso isto e, depois, suspiro, com uma espécie de culpa a interromper-me a modorra, ali entre o sumo de maçã e alguns trabalhos de casa de Francês.

Ribeira de Pena, 04 de Junho de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, em http://www.aorodardotempo.blogspot.pt.]

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Pergunta

 
Entre Ribeira de Pena e o Arco, aí a um quilómetro da ponte de Cavez, vejo uma cobra morta no meio da estrada. É uma cobra cinzenta, mal enrolada sobre si, em forma de ponto de interrogação. Como tenho a mania dos símbolos, vejo ali uma pergunta no meio da minha via rotineira, habitual, funcionária. Isto é, no meio do meu percurso, há talvez esta pergunta: "Para quê, Joaquim Jorge?"
A pergunta é desenhada com uma cobra morta. E eu pergunto-me se não será ela já uma pergunta morta.

Arco de Baúlhe, 3 de Maio de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho