Bússola do Muito Mar

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Número de Ondas

quarta-feira, 17 de março de 2010

Quase Bucólica


Passam sob a minha janela
Uma velhinha, um velhinho e um cão.
A mulher veio ao centro de saúde
(Medir as varizes e os diabetes)
E o marido veio, contrariado, com a esposa.
O cão apareceu não se sabe de onde
(Acho que gostou do cheiro a cadela
Na roupa do velhinho).

Atravessam os três a rua até à camioneta
(A velhinha à frente, depois o velhinho, atrás o cão).
O homem resmunga qualquer coisa e a mulher
(Quem sabe, suspirando)
Concorda e encolhe os ombros antigos.

Falta agora pouco para aquele casal regressar
Ao anonimato onde, visto da minha janela, reside
(Longe dali, dos meus olhos, da minha rua).
Talvez naquele saco a velhinha leve medicamentos
E talvez a cara severa do marido tenha a ver com isso
(O preço, sem remédio, dos remédios).
O cão urina junto à paragem, sobre duas rosas.

A velhinha usa óculos e espera.
O velhinho tem um chapéu preto sobre a cabeça
E, como a velhinha, espera.
O cão já lá não está
(Ou não se vê).




Ribeira de Pena, já 17 de Março de 2010.
Joaquim Jorge Carvalho
(A pintura é de Frida Kahlo.)

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