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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Ideais (Precisa-se)


Portugal não foi sempre isto. Nem o Partido Socialista foi sempre isto.
O PS de Mário Soares, de Álvaro Guerra, de Manuel Alegre, de Sottomayor Cardia, de Almeida Santos, de Salgado Zenha – era outra loiça. Havia idealismo, generosidade, cerviz.
A nossa triste contemporaneidade trouxe o que está à vista. As causas deram lugar a tácticas e interesses. A vida deu lugar à vidinha. É assim nos maiores partidos portugueses. Mas dói-me isto mais no PS por me ter habituado a, no passado, identificar o punho ou a rosa com a própria ideia de digna liberdade.
Muitos dos actuais políticos portugueses chocaram nos aviários chamados Jotas: JS, JSD. JC, JCP. Dali saem formatados, boys & girls já muito velhos, correndo ao cheiro de cargos e sinecuras: lugares nos parlamentos, nas secretarias importantes, nos bancos, nos governos, nas empresas públicas e – seja lá o que isso for – nas empresas privadas.
A moral é uma palavra que, hoje, não significa nada. Pina Moura, ex-comunista, quando há uns anos ainda tinha um pé na Iberdrola (espanhola) e outro na Assembleia da República (portuguesa), ao ser questionado sobre a questão do conflito de interesses, respondeu que a sua ética era a “republicana”. E concretizou: sendo a sua situação “legal”, não havia problemas. Talvez seja assim, de um ponto de vista puramente jurídico, cínico. Mas a ética (republicana, monárquica, rosa, laranja, azul, vermelha) é outra coisa. Deveria ser outra coisa.
Também Mariano Gago, o ministro da Ciência e do Ensino Superior, disse um dia na televisão, sem se rir, a propósito da – digamos assim – licenciatura do primeiro-ministro, que se tratara de “um percurso académico exemplar”. Foi, pois, mais longe que Pina Moura; não apenas as vicissitudes deste curso, cheio de equivalências e de pormenores singulares, foram legais, no entender de Gago, como ascendem à categoria de “exemplo” para a juventude portuguesa.
Acreditei então, como agora, que Sócrates não cometeu qualquer crime nessa sua saga na falecida Independente. Mas recusei dá-lo como paradigma à minha filha, a qual fez os normais cinco anos de universidade para se licenciar em Direito. Chamai-me antiquado.
Entretanto, vou estando farto das notícias que, todos os dias, afligem o país. De negociatas, de arranjos subentendidos, de jogos, de favores, de compadrios. Vou estando farto, aliás, deste país que também sou eu. E não se pode emigrar para fora de nós.
Creio que boa parte do problema de Portugal está em que, por falta de comparência das grandes figuras, a classe política se encheu de mediania e de mediocridade. António Vitorino e Marcelo Rebelo de Sousa, por exemplo, preferem o conforto do comentário à condução dos respectivos partidos (e do governo); essa espécie de desistência abre caminho a uma gente normalmente inculta, sem ideais, sem causas e muito pobre de gramática.
Não acredito que Mário Soares ou Pinto Balsemão durmam descansados.

Ribeira de Pena, 18 de Fevereiro de 2010.
Joaquim Jorge Carvalho

2 comentários:

TELMO BÉRTOLO disse...

Caro Amigo,
Estou plenamente de acordo contigo! Nos tempos actuais o que conta é o dinheiro. E o mais importante é o parecer. É revoltante assistir a políticos a taparem o Sol com uma peneira, a negarem evidências...
Um abraço,
TB

Joaquim Jorge Carvalho disse...

Olá, Amigo! Obrigado por visitares este Mar.
Estamos de acordo, sim.
E, já agora, a tua expressão "a taparem o Sol" tem, neste caso, uma particular força!

Abraço.

JJC