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O Assalto
- Mãos ao ar. Isto é um assalto – disse ela, sem sequer mexer os lábios.
- O amor ou a vida! – exclamou, na mesmíssima quietude e snob delicadeza em que eu sempre a vira.
Habituado à mediocridade dos meus dias, dei-lhe o amor (querendo, com tal opção, poupar a vida que então me parecia mais preciosa que tudo). E admirai-vos: o amor era muito maior do que eu podia imaginar, por isso demorando também o assalto muito mais do que era legítimo esperar-se em tão periclitante ocasião.
Ao fim de horas, dias, meses, o assalto prosseguia – e dava-se o caso, mais estranho entre todos, de o assaltado sorrir reconhecidamente para a fera assaltante.
Despreocupado já com a prosaica questão de pormenores e trocos, dei-lhe também a vida. E mantive, sem que me obrigassem a tal, as mãos no ar; não por obediência conforme ao roubo, portanto: antes numa prece ao Tempo para prolongar a maravilhosa violência que (me) feria de morte o cinzento baço dos dias.
Coimbra, 19 de Fevereiro de 2010.
Joaquim Jorge Carvalho
[Trata-se do 4.º texto do volume “A Depressão das Laranjas” (Ribeira de Pena, Ed. Casa de Santa Marinha, 1999.) A imagem recorda o filme “Casablanca” (1942), realizado por Michael Curtiz e interpretado por Humphrey Bogart e Ingrid Bergman.]
4 comentários:
Um dia uma amiga minha há muito escrevedora em blogs, disse-me que os textos mais bonitos são os que têm menos comentários. O facto deve-se a que, ao lê-los, ficamos sem palavras e apenas nos ocorre o elogio gasto. Grande parte dos textos deste blog, entre hoje e ontem li-os todos, causam-me espanto. Creio que perceberá o que quero dizer.
Continuação de muitas ondas e muito mar.
CG
Registo, comovido, o seu comentário.
Venha mais vezes a este Mar!
Abraço.
JJC
JJ
há palavras que nos beijam! que nos abraçam! e que nos acelentam!
que lindo!
desta serra que também tem o meu mar dentro
ana
Vejo que conseguiu resolver o problema da localização do blogue.
Fico feliz por isso e pela cumplicidade onde humana e literariamente residimos.
Beijonho, Amiga.
JJC
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