quarta-feira, 28 de abril de 2010
Sobre a ideia de Dor Literária
Horácio recomendava aos candidatos a poetas: “Si visum flere est primum libi ipsum.”
Traduzindo livremente, “Se queres, com a tua poesia, fazer-nos chorar, hás-de tu próprio sentir, primeiro, a mesma dor que provoca o choro.” Ou, como preferiu traduzir Henry Fielding (em “Tom Jones”), “O autor que me fizer chorar há-de primeiro chorar ele próprio.”
À boleia de Horácio, julgo que a grande literatura se funda, quase sempre, numa dor verdadeira.
Atenção: quando digo “dor”, não falo só de temas e assuntos tristes; falo de uma agudíssima sensibilidade face à pele e ao coração dos dias. De uma atenção absoluta face ao visto, ao recordado, ao sonhado. De uma consciência afiada face ao que o mundo é e ao que o mundo poderia e, talvez, deveria ser. A dor, portanto, pode ter a ver com riso ou lágrimas.
A dor verdadeira não significa que a literatura se reduza ao desabafo momentâneo de um lírico. A dor é apenas um ponto de partida e, por razões operacionais, pode até ser inventada (ou fingida, como ensinou Pessoa). Mas é verdadeira por significar a imperiosa necessidade de, a partir dela, escrever a verdade.
Nem sempre percebemos a riqueza, a magnificência e a verdade de uma dor olhando para o poeta.
Percebemos talvez o tamanho e o valor da dor olhando para a linguagem do poeta, para os textos do poeta, para a Língua que o poeta inventa.
Vistas as coisas assim, a beleza dói.
Ribeira de Pena, já 28 de Abril de 2010.
Joaquim Jorge Carvalho
[Foto JJC.]
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
2 comentários:
E vistas as coisas assim, isto é uma aula.
Espero que não aborrecida...
Bj.
JJC
Enviar um comentário