Comprei,
em saldos, um livrinho de Jacques Prévert publicado originalmente em 1963 (ano
do meu nascimento) e que a Teorema em boa hora decidiu recuperar. Chama-se Histórias para meninos sem juízo
(tradução para Português de Pedro Tamen). Recorrendo ao universo da fábula, o
autor fala – sobretudo – da sociedade dos homens.
Houve
um excerto que me impressionou particularmente e que ecoa qualquer coisa do Animal Farm, de Orewll. Relatando a
exploração a que os cavalos eram submetidos pelos homens, o narrador dá conta
da iminente revolta equídea e diz (páginas 62-67):
«Então,
todos os outros pobres cavalos começarão a compreender e irão todos juntos
falar-lhes grosso. // Os cavalos:
“Meus senhores, está bem que puxemos os vossos carros e as vossas charruas, que
façamos as vossas corridas e todo o trabalho, mas hão-de reconhecer que é um
serviço que lhes prestamos e vocês têm que retribuir; muitas vezes comem-nos
depois de mortos, e não temos nada a dizer quanto a isso, já que gostam: é como
com o pequeno-almoço da manhã, há os que tomam aveia com café no leito, outros
aveia com chocolate, cada um tem os seus gostos; mas também muitas vezes nos
batem, e isso não deve tornar a acontecer.” // “Além disto, queremos aveia
todos os dias, água fresca todos os dias, e também férias, e que nos respeitem
– somos cavalos, não somos bois.” // “Ao primeiro que nos bater, mordemos-lhe.”
// “O segundo que nos bater matamo-lo, e pronto.” // E os homens irão
compreender que foram um pouco longe de mais e hão-de tornar-se mais cordatos.
// O cavalo ri-se ao pensar em todas estas coisas que de certeza hão-de
acontecer um dia. // Apetece-lhe cantar, mas está sozinho e só gosta de cantar
em coro; então, mesmo assim, grita: “Viva a liberdade!” // Em outras ilhas,
outros cavalos ouvem-nos e gritam por sua vez com todas as forças: “Viva a
liberdade!” // Todos os homens das ilhas e os do continente ouvem estes gritos
e perguntam a si mesmos que será, mas depois tranquilizam-se e dizem encolhendo
os ombros: // “Não é nada, são cavalos.” // Mas mal sabem eles o que os cavalos
lhes preparam.»
Fiquei
a relinchar para os meus botões: Que tem isto a ver comigo? Connosco?
Coimbra, 30 de Julho de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho
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