Bússola do Muito Mar

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Número de Ondas

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Apografia 23: Reportagem

Casa de partida (Mãe), Estação Velha, Choupal, hipódromo, regresso. Início da corrida às seis da tarde. Chegada às sete e meia. O exercício físico propriamente dito não ultrapassou os trinta e cinco minutos, mas a passagem pelo Choupal tomou-me mais tempo do que habitualmente. Explico-o.

Na vala que desvia (virtuosamente) a água do Mondego para os campos agrícolas, vi um cão grande e negro debatendo-se, nadando de forma desajeitada, lutando pela vida, não conseguindo subir até à margem. Pareceu-me uma tarefa quase impossível, aquela, porque o cimento que alberga a água é uma espécie de parede oblíqua, decerto impeditiva da aderência de mãos ou. No caso, patas. O cão desesperava. O dono, um rapaz de vinte e poucos anos, perseguia o animal, à velocidade da corrente. Um outro rapaz gritava pelo animal e pelo amigo, correndo também. Eu estava no lado contrário daquela margem e doía-me não poder ajudar.
O dono do cão conseguiu ganhar uns dez metros de vantagem e deitou-se sobre a vala, estendo as mãos enquanto aguardava a passagem do cão. O cão percebeu o socorro e aproximou-se do salvador. Por um instante julgámos que iria conseguir solucionar o problema. Afinal, o homem acabou por cair também.
Agora, cão e homem debatiam-se, levados pela feroz corrente. O amigo do dono tentou deitar-se e oferecer os pés como ponto de apoio. Ia caindo também. Transeuntes, cúmplices daquele desespero, tentavam ajudar. Todos corriam (todos corríamos) ao longo da vala, porque a corrente filha-da-puta nunca abrandava.
Um homem apareceu subitamente com um longo ramo que fora buscar à mata. Três homens seguraram o ramo que o dono do cão conseguiu dificultosamente alcançar, sempre com o cão junto a si, puxado pela coleira. A história acaba com abraços, o cão saracoteando-se e algumas lágrimas nascidas da emoção.
Limpei as minhas e segui o percurso habitual. A vida é um fertilíssimo palco de histórias más e histórias boas. Hoje, boa.

Coimbra, 24 de Agosto de 2013.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, em http://www.fabiodutra.com.br.]

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