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Número de Ondas

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

O Amor, segundo Unamuno


O DN de 12 de Agosto trazia um brinde não despiciendo: um opúsculo (de contos) muito simpático intitulado Amores (Lisboa, Rosto Editora, 2011). Conteúdo: “Uma História de Amor”, de Miguel Unamuno (um dos autores mais admirados pelo nosso Miguel Torga); e “A Outra Mulher”, de Sherwood Anderson (que me lembro de ter estudado em Literatura Norte-Americana, aí por 1985).
O conto de Unamuno (com tradução é de Maria Judite de Carvalho) é uma maravilha, quer no plano do enredo, quer no da linguagem elegante e depurada. Ficou-me da leitura um passo formosíssimo sobre a noção de amor (pp. 42-43). Ofereço-vo-lo:
“Esperar o Amor! Só o espera quem já o tem dentro de si! Julgamos abraçar-lhe a sombra e já ele, o Amor, invisível aos nossos olhos, nos abraça e nos oprime. Quando julgamos que morreu em nós, é porque já tínhamos morrido dentro dele. E logo desperta quando a dor o chama. Porque não se ama deveras senão depois de o coração do amante se ter misturado no almofariz da angústia com o coração do ser amado. É o amor paixão partilhada, é compaixão, é dor comum. Vivemos dele sem nos darmos conta disso, tal como nos não damos conta de que vivemos do ar senão no momento da asfixia angustiosa. Esperar o Amor! Só espera o amor, só o chama quem já o tem dentro de si, que vive, ainda que o não saiba, do seu sangue. É a água subterrânea que aviva a secura. Sentimos às vezes securas abrasadoras, como as do campo deserto, que estala de sede enquanto voam à solta, à superfície, as folhas levadas pelo vento suão; e todavia, nas profundezas desse mesmo campo, por debaixo das raízes da sua verdura morta, corre sobre a rocha que a sustém, o manancial das águas do céu. E é o rumor dessas águas profundas que se junta ao rumor das folhas secas. E há um momento em que a terra seca e sedenta se abre e brotam à sua superfície as águas adormecidas. Assim é o Amor.”
Senhores: a literatura é uma praia onde se está sempre bem.

Coimbra, 16 de Agosto de 2011.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, em http://www.mollydood.wordpress.com.]

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