quarta-feira, 2 de junho de 2010
Quatro Poemas do (meu) Milésimo
1. A Lua
E disse Deus aos homens e aos montes:
Eu vos declaro unidos
Até que o Norte vos separe.
Sendo certo que o norte do norte máximo
É a lua –
Ficou para sempre o amor do homem
Com medo dos céus.
2. As estrelas
A meu modo, pesco estrelas
Com santa paciência e bondade,
Inutilmente –
Quando sorriem, trans-rainhas de mim
De lá de cima
É evidente e brilhante a minha derrota
Mas também
O meu destino.
3. O destino
Os outros
São seres à superfície
Rentes à vista.
Mas eu não –
Sou água milenar das profundezas
Sub-cave da montanha mais alta
Rés-do-chão das algas no lugar do mar.
A minha identidade é um caminho:
Não nasço, ergo-me
E meus passos são uma teimosia
Contra o vento.
Todas as brisas existem contra mim
E cada sopro adversário é uma faca
E cada gesto meu é uma agilidade
E cada resistência é uma ferida.
Não fujo
Não posso
Não quero fugir.
A morte de mim será uma cicatriz florescendo
E haverá no devir do pus, da dor
Uma rosa-lápide cheirando a alma
E a sangue silvestre.
Ergo, sum.
Não fujo
Não fico
Vou
Vou sempre!
4. O milagre
Uma coisa chamada mão encontrou-me
E a minha mão encontrou uma coisa chamada mão.
A coisa chamada mão deu-se-me
E eu dei a minha mão à coisa chamada mão.
A este milagre
(complexo, na aparência enunciatória)
Chama-se mãos dadas
Ou luz.
Ribeira de Pena, 02 de Junho de 2010.
Joaquim Jorge Carvalho
[Uma primeira versão destes 4 textos foi escrita em 1996, integrando o volume de poesia Milésimo de Torga. Foto JJC.]
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário