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Número de Ondas

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

José Tolentino Mendonça



José Tolentino Mendonça é um importante poeta do nosso tempo. A sua poesia fala-nos dos grandes temas de sempre – a Vida, a Morte, o Tempo, a busca da Transcendência –, nunca abdicando de um certo chão referencial (o que me agrada sobremaneira). À imagem do que fazem também, por exemplo, Cesário, algum Pessoa, Ruy Belo, Manuel António Pina, Jorge Sousa Braga ou Álvaro Magalhães, os pormenores físicos do quotidiano comparecem no texto, dão vida aos sentidos e ao vocabulário, contribuindo para a frescura e o ritmo do enunciado poético. 
Tolentino viveu em Machico, na sua juventude, e em boa hora alguém se lembrou de gravar na pedra a sua voz, bem no centro da cidade natal da MP. Quem passar pela Praceta 25 de Abril, verá escrito numa parede do edifício da “La Barca” um belo poema (do livro A noite abre-me os olhos, de 2006): 

No caminho onde aprendi o Outono
sob o azul magoado 
os pescadores cruzam ainda linhas 
províncias clareiras 
e esse gesto masculino de apagar a dor 
chegava pelos percalços da terra 
o carro do gelo 
e os miúdos tiravam bocados para comer às dentadas 
um retrato selvagem mas, juro-vos, havia encanto 
havia qualquer coisa, outra coisa 
nesse instante em perda 
as mulheres sentavam-se à porta com os bordados 
quando passavam estrangeiros 
ficavam sempre a sorrir nas suas fotografias.” 

Ouço por aqui testemunhos de admiração exclusivamente atinentes à carreira que Tolentino Mendonça fez na Igreja católica (é hoje arcebispo e, por decisão do Papa, arquivista e bibliotecário no Vaticano). Poucos, contudo, parecem aqui conhecer ou valorizar a sua singular importância na poesia da nossa língua. Mas ele é hoje um nome que, também a este nível, merece o reconhecimento e até o justificado orgulho dos machiquenses. 

Machico, 13 de Agosto de 2018. 
Joaquim Jorge Carvalho
[A segunda foto é de JJC.]

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