Numa
esconsa nota à roda da selecção polaca (lida, salvo erro, no JN), soube que o
médio Jakub Blaszczykowski - nome de guerra: Kuba – viu a sua Mãe morrer às
mãos assassinas do Pai, em 1996. O
jogador do Borussia
Dortmund era, à época, um menino com apenas 10
anos.
O
episódio é suficiente para provocar uma profunda comoção em qualquer ser humano.
Mas o textito acrescentava esta informação: agora, quando o polaco obtém um
golo, ajoelha-se, olha para o céu e ergue as mãos, como numa prece: assim
agradece à Mãe – diz ele – o facto de continuar presente, apesar da morte,
iluminando-o, animando-o, inspirando-o.
Quando,
em qualquer narrativa ou argumento, aterra a imagem da Mãe, eu sou, sem vergonha
nem remorso, um fatal lingrinhas. E, correndo o risco de perder, por estes dias
de euforia futebolística, a nacionalidade portuguesa, aqui vos confesso – ai de
mim! – que senti, misturado com a doçura da nossa vitória sobre os polacos, um
escandaloso travo de amargura. É que o menino Kuba foi, do lugar de onde
percebi o jogo, um dos derrotados da noite.
Os
meus pacientes leitores já sabem, no momento em que lêem estas perecíveis
linhas, se Portugal chegou ou não à final do torneio. Vou imprudentemente supor
que sim – e que, na nossa memória, ardem ainda as imagens de um qualquer remate
genial (oxalá do rei Ronaldo), um qualquer carrinho salvador de Raphael
Guerreiro, um qualquer voo impossível de Rui Patrício. Vamos até, em demencial
e infantil devaneio, imaginar que, aí pelas 10 horas da noite do dia 10 de
Julho, 12 anos depois de a Grécia nos ter reexplicado o conceito de “tragédia
espectacular”, Portugal é campeão europeu de futebol.
Perdoai-me,
ainda assim, este pecado lamechas, ó cúmplices foliões da bola - mas eu preferirei
para sempre, de entre tantos gestos e dribles e defesas e vitórias, aquela
imagem de Kuba, após um golo à Ucrânia, no dia 21 de Junho, ajoelhando-se,
erguendo os olhos e os braços para o céu, agradecendo à sua Mãe. Não morta,
sublinho: viva, afinal, por o seu menino, lembrando-se dela, não a ter deixado
morrer.
Vila Real, 02 de julho de 2016.
Joaquim Jorge Carvalho
[Esta crónica foi publicada no
semanário O Ribatejo, edição de
07-06-2016.]
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