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terça-feira, 11 de setembro de 2012

Manuel António Pina


A (ainda viva) RTP 2 ofereceu-nos, nesta noite de 10-09, um magnífico documentário sobre o escritor Manuel António Pina (trabalho com realização de, salvo erro, Ricardo Espírito Santo).
Manuel António Pina é um dos grandes artífices da Língua Portuguesa moderna, brilhante em quase tudo quanto se mete a fazer em matéria de literatura – poesia, claro, mas também teatro, mas também narrativa. Eu gostava que ele se decidisse a escrever um romance! Se ele um dia o fizesse, seria decerto um grande romance.
Quem conhece a literatura de Pina, percebe como a boa escrita se funda fundamentalmente no uso certo e belo da linguagem e, em concomitância fatal, na (re)invenção constante da linguagem. O real é para aqui chamado: é no regaço do mundo que se percebe a gente; é nos sonhos de cada um que se percebe que o sonho é sempre o mesmo, embora plural (sair-se de nós e voar); e é nos lábios das pessoas que afinal cada verso nasce, que cada verso se diz (ainda que tudo nasça do silêncio anterior à enunciação).
Um dos amigos do escritor sublinhava o facto de Manuel António Pina, apesar de ser uma fonte constante de lucidez, graça e encantamento, nunca se levar a sério. Esse desprendimento, que me parece natural no poeta de Nenhuma Palavra Nenhuma Lembrança, pode enganar-nos, isto é, julgar a gente que ele é, na nossa contemporaneidade, apenas mais um, e em boa verdade tratar-se de um vizinho de nós que já é imortal.
Hoje à tarde, uma estimável senhora confessava-me o seu apreço pelo “escritor” José Rodrigues dos Santos. Eu descuidadamente chamei, ao escritorastro, “vendilhão”. Perdoai-me, não era bem isso que queria dizer. Mas ocorre-me comparar o telejornalista a Manuel António Pina (e a Mann, e a Daniel Abrunheiro,  e a Vergílio Ferreira, e a Saramago, e a Mário de Carvalho, e a Italo Calvino, e a Luísa Costa Gomes, e a García Márquez…). Vista a coisa deste ângulo, o rapaz dos telejornais escreverá, sim, mas aquilo não é bem literatura.

Ribeira de Pena, 10 de Setembro de 2012.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem (de um belíssimo livro intitulado Nenhuma Palavra Nenhuma Lembrança) foi colhida, com a devida vénia, em http://paginaliterariadoporto.com.]

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