Mundo por ver
Toda a gente tem
uma prima ou uma tia que, em certo momento, no decurso de uma visita
turístico-cultural (a uma praia, a um castelo, a uma exposição, a uma igreja, a
um museu), exclama: “Vamos embora, que isto já está tudo visto!”
São as mesmas pessoas
que, por terem passado uns dias nos Açores, ou na Madeira (ou em Coimbra, ou no
Minho, ou em Trás-os-Montes), garantem aos interlocutores um conhecimento
exacto e completo daquilo tudo.
Tamanha presunção, apesar da paciência quase infinita a que denodadamente me
obrigo, irrita-me, sobretudo quando estas vozes tão auto-suficientes se referem
a lugares muito presentes na minha própria biografia. Por exemplo, eu tenho 53
anos de Coimbra e nunca direi que conheço “aquilo tudo”, ó querida tia (ou
prima, ou vizinha, ou colega, ou senhor que conheci casualmente no casamento do
meu cunhado Paulo).
Por razões
familiares, venço às vezes o meu medo patológico de voar – e lá venho, no
remanso de Agosto, à Madeira. (Nota: o avião que me trouxe, no passado dia 2,
chamava-se Fernando Pessoa. Uma multidão, portanto, com motor.) Nunca me canso
de admirar a baía de Machico. Em especial, o Mar, meu habitat primordial, que vejo pouco no resto do ano. Esta crónica
foi escrita, aliás, ao som das ondas rebentando nos calhaus, espécie de tributo
musical à eternidade. Já aqui estive tantas vezes, caros leitores, a olhar para
esta paisagem. E nunca seria – nunca serei – capaz de dizer, sobre isto, que está tudo visto.
Coimbra, 01 de Agosto de 2016.
Joaquim Jorge Carvalho
[Esta crónica foi publicada no jornal O Ribatejo, edição de 04-08-2016.]
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