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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

O dia antes da felicidade


Mestre João, o meu sogro já falecido, porém eternamente vivo na minha cabeça, costumava dizer, perante qualquer queixume nosso de dores físicas (uma gripe, uma distensão muscular, uma cefaleia), que "isso" era "uma coisa que aparece sempre antes da morte". Lembrei-me desta verdade há dias, durante a leitura de uma interessantíssima novela, da autoria do italiano Erric De Luca.
A Olívia Sofia ofereceu-me (mais) esse livro - e eu agora devo-lhes - a ela e ao dito livro - algumas palavras.
Chama-se O Dia Antes da Felicidade. É um livro pequenino, uma narrativa escorreita e hábil, uma coisa simples e fresca como, direi, a água.
A história narrada compreende a infância e juventude do eu contador, numa Itália pobre e receosa, ali pelos anos 40 do século XX, quando a grande guerra e as sequelas da grande guerra assombravam quantos viviam naquele lugar e naquele calendário.
Pela voz sábia de alguns adultos, mas também pela mão de livros e pela própria experiência que a vida lhe vai oferecendo (factos, medos, deslumbramentos, sonhos, amores, sexo), o narrador aprende quanto de essencial lhe é dado aprender sobre o mundo, sobre as pessoas, sobre o destino.
Aprende, por exemplo, que o tempo não é "uma montanha", mas sim "um bosque" - e que é a partir da folha que descobrimos a árvore matricial que importa e, talvez, o futuro. Que o sofrimento é sempre a véspera da felicidade, e que a felicidade é sempre a memória remanescente do que vem (ou há-de vir) depois. Que o sémen é, no amor, o "sangue branco" da plenitude. Que cada chegada é, na nossa vida, o momento de partir. Que se sofre por termos partido e também, se não partirmos, por não termos partido.
Em verdade vos digo eu, no devir da leitura deste livro, que já não me lembro do dia em que o não tinha lido. Era, sei-o agora, como diria Mestre João ou Erric De Luca, o dia antes da felicidade de o ler.

Ribeira de Pena, 03 de fevereiro de 2015.
Joaquim Jorge Carvalho

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