Bússola do Muito Mar

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Número de Ondas

terça-feira, 4 de março de 2014

Ao jovem Domingos que não pode ter morrido


A notícia atingiu-me como um pontapé estúpido, uma agressão brutal na cabeça, no coração. O "Luisinho" morreu, disseram-me subitamente, ainda a manhã de Inverno se preparava, em Coimbra, para ser o frio, a ventania e a chuva do costume.
"Luisinho" era como chamavam, em Ribeira de Pena, a um rapaz de quem tive a honra de ser professor. Eu tratava-o pelo nome que encontrei num livro de ponto de há dezoito anos: Domingos.
Era um rapaz inteligente, de bom carácter, amante da literatura, do desporto, dos amigos - e de causas nobres. Ao longo dos anos, apreciei gratamente o seu crescimento em em cidadania, o seu desenvolvimento académico, a sua maturação pessoal. Em alturas diferentes, contou-me que fizera Erasmus, que trabalhava em Vila Real, que tinha projetos. Sabia-me bem, por outro lado, o seu respeito e a sua estima por um antigo professor a envelhecer. 
Contava com ele, como conto, em geral, com os melhores jovens que vou conhecendo e que, na medida das minhas possibilidades, vou ajudando a crescer, para ajudar o futuro a ser melhor. O seu futuro e o meu. O futuro do nosso país, o futuro do mundo.
Uma doença traiçoeira roubou-o. Ao Domingos. Ao futuro.
Há tempos, li alguns textos que o Domingos escreveu, durante uma peregrinação até Santiago de Compostela. A parte dessa diarística por mim lida, tanto quanto agora recordo, não anunciava o fim da sua viagem. E a minha pobre homenagem a este amigo, tão cedo saído da nossa vila comum, é exactamente pensar nele, doravante, como alguém para sempre em demanda de outras paragens. Como se o Domingos não morresse. Como se não morrêssemos.


Coimbra, 02 de Março de 2014.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem (de Alvadia, terra natal do Domingos) foi colhida, com a devida vénia, em http://www.cm-rpena.pt.]

2 comentários:

Rosa Miranda disse...

É tão violento e impossível sentir a finitude da Vida, mais ainda quando a idade ainda não nos comunica a proximidade do fim... Tenho tanta necessidade de acreditar que não há fim, que o Nada não cabe no tão indizível valor de cada Vida... Talvez outra etapa, talvez a continuidade impercetível à nossa capacidade de, claramente, perceber!

SIRF disse...

Gostei. É bom saber que cada aluno tem um lugar na sua memória.
Lindo texto de homenagem.
Obrigada