A uns metros da descida final do caixão à eternidade subterrânea, um familiar do meu amigo falava da morte de uma outra senhora, contemporânea da que ali se despedia do mundo, e que na semana anterior falecera também, de forma inopinada.
Guardei a narração num cantinho do meu coração: a senhora passara bem o dia, jantara com a família, deitara-se. De manhã, a filha estranhou o facto de tanto tardar o pão da manhã, trazido diariamente pela senhora sua mãe. Acabou por dar o pequeno-almoço ao marido com o pão duro restante do dia anterior. Passou uma hora, passaram duas. A Mãe não aparecia.
A filha foi à casa onde a senhora vivia. Bateu à porta. Ninguém veio abrir. Usou a chave que tinha para ocasiões destas e assustou-se com o silêncio. No quarto, já memória, estava a sua Mãe, como se dormisse.
Abracei o narrador, genro desta senhora, e segui para o meu carro. Batia-me na cabeça uma ideia muito triste e talvez poética: quando uma Mãe parte, perde-se-nos o pão de cada dia.
Coimbra, 26 de Maio de 2019.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, em https://www.sulinformacao.pt.]
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