O homem recorda-se de um conto de Hemingway, “Indian camp”. Perante a cruel novidade da morte, um rapaz, o filho de um médico, jura a si mesmo que nunca há-de morrer. Pensa (de cor): “He decided that he would never die.” É uma “decisão” patética da criança, que é suficientemente ingénua para ignorar a inevitável morte a haver, ou que está tão consciente do fim que, em negação aparente, prefere acreditar na imortalidade. Em ambos os casos, aquela é uma personagem digna da piedade leitora.
O homem, ao pensar na mãe, parece uma criança: não suporta a distância, pede-lhe mentalmente perdão por crimes que não são senão imputáveis à velhice e à morte. Passado um ano, o choro do triste permanece. Às vezes, a mulher apercebe-se de que o marido continua a sofrer, como uma criança, a falta da mãe. À porta de casa da mãe do homem, um ano depois de tudo ter acontecido, há um vaso sem vestígio de flores.
O homem, quando leu aquele conto de Hemingway, teve pena do rapaz que se recusava a aceitar a morte. Agora, sobre o desaparecimento, aos poucos, da mãe, o homem decide que, no que depender de si, ela nunca lhe morrerá.
Coimbra, 27 de Junho de 2021.
Joaquim Jorge Carvalho
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