Bússola do Muito Mar

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Número de Ondas

quarta-feira, 17 de abril de 2019

F(r)ases da Lua


Nota prévia: a minha Colega/Amiga Rosário Coelho pediu-me pequeninos textos que começassem por determinadas letras. Essas frases completariam o cenário que preparara para o Sarau da nossa Escola, concretizado no dia 3 de Abril do corrente ano. Andei com esse pedido na cabeça durante um dia. Devo ter parecido, então, aos que me rodeavam bastante distraído e alguém, com razão, me acusou de "estar na lua". Era verdade - daí ter chamado "Frases da Lua" (depois "F(r)ases da Lua") ao conjunto de frases fabricadas. Ei-las.



Três para a letra B -

Boa noite”, disse a lua, aparecendo no céu.
“Boa noite”, respondeu o poeta. O meu poema estava à tua espera.

Branca como a neve só a própria neve”, disse a neve. “Para me perceberem, têm de ver, de pensar, de sentir como eu. Têm de ser como eu. Têm de ser eu.”

Beatriz é o nome do grande amor de Dante. O famoso “Inferno de Dante” não é um lugar: é não ter Beatriz junto a si.


Cinco para a letra D - 

Dá-me a tua mão, amor, contra a escuridão. Quero dizer: para haver Sol.

Disseste que seria para sempre. Não venhas agora com as desculpas da mortalidade ou do tédio, ouviste?

Ditosa Pátria minha amada”, disse Camões. E, grata e orgulhosa, a Pátria volveu Poema.

Descemos para o chão, por nos dizerem que tínhamos de viver com os pés aí. Depois, passámos a vida com saudades de voar.

Depois do mar, é provável que nada exista. Por isso navego, como se o mar fosse tudo.



Duas para a letra I -

Irmãos, está-se a acabar o Futuro. Não podemos perder tempo!

Ir é um verbo com bichos-carpinteiros. Os bichos metem-se no verbo, cheios de sonhos e de impaciências, e vão. 



Três para a letra J -

- Janela, que há lá fora?
- Mais tarde, hás de saber.
- Mas podes dizer-me agora?
- Não perguntes, vai lá ver.

Jesus, por ser poeta, falava como as aves, cantando como se fosse um pássaro. Quem o ouvisse com o coração, voaria para o céu.

Junho inunda o calendário de Sol e de cheiro a maresia real ou imaginada. Acontece-me, por essa altura, acreditar que o Inverno não existe.


 Uma para a letra L -

Lavei o rosto com a água de um regato pequenino e anónimo. Só depois comecei a ler. O livro, sorrindo, deixou-me entrar como se fosse da casa.


Uma para a letra A -

Amor não é bem uma palavra. É o som do mundo à procura de música.


Uma para a letra V -

Virei à hora habitual do entardecer, com aquela urgência de chegar ainda com luz, só para te ver passar a caminho de não estares.


Duas para a letra F -

Felizes os que caminham felizes só pela felicidade de caminhar.

Faz de conta que sou um piano e toca-me, com a delicadeza e a competência necessárias, para enfim suceder a música querida.


Coimbra, 17 de Abril de 2019.
Joaquim Jorge Carvalho
[Desenho de Rosário Coelho.]

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