Bússola do Muito Mar

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Número de Ondas

terça-feira, 7 de julho de 2015

Instantâneo filipino ou Arte Poética (revisões)



Vem no JN. Uma criança aproveita o néon da publicidade para fazer os trabalhos de casa. Talvez não tivesse (como se lê no jornal) electricidade em casa. Talvez não tivesse silêncio ou paz em casa. Talvez não tivesse casa. Queria estudar e aproveitou a involuntária benesse da urbe - um pedacinho de luz, um rudimento de banco, algum tempo livre.
Hei-de falar disto aos meus alunos: para que eles entendam o que se passa com o jovem filipino; para que eles entendam o que se passa consigo mesmos; para que eles entendam o que se passa com o mundo.
A vida ensina-se.
A vida é um constante enunciado de si própria. A vida é um poema - e é uma arte poética consubstancial ao poema.



Vila Real, 04 de Julho de 2015.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, no JN (edição de 04-07-2015).]









Praia do Desejo


1
O poeta dá asas aos frutos.

2
Os frutos saem das árvores –
Voam para fora do pomar natal
Voam à roda dos olhos
(Voam por dentro e por cima do poema).

3
Os frutos exibem ou sugerem
A sua forma única, a sua específica
Textura, o seu inconfundível sabor
O seu característico caroço, a sua
Própria cor, a sua original condição
De liberdade.

4
Nenhum fruto volta à árvore original.
Nenhuma prisão o guarda para sempre.

5
O destino dos frutos admiráveis é
Serem admirados.

6
Muitos frutos tornam-se pássaros, outros
(Que pena haver o bruto Tempo!)
Envelhecem
Indistintamente.

Vila Real, 04 de Julho de 2015.
Joaquim Jorge Carvalho

[A imagem foi colhida, com a devida vénia, em http://www.baudeatividades.blogspot.com.]

Sob o Tempo (Sobre o Tempo)


Somos reféns do Tempo
Até ao fim.
Não há resgate que nos salve
Do sequestrador consabido.
Mas basta um pequeno raio de sol
Colhida à janela da prisão
Para nos fingirmos
(Para nos sentirmos)
Livres
Eternos!

Vila Real, 04 de Julho de 2015.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, em http://www.caminhosdamemoria.wordpress.com.]

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Canção de antes do fim


"Tudo o que não tem remédio, depois de dito, remediado está." (JJC)

Tem sempre um outro lado a nossa vida
Porque a cada dia há um verso novo
Que traz consigo já o seu reverso
Isto é, o fim, o adeus, nova partida.

Há mortes que discretamente ocorrem
Sombras leves sobre o sol, sobre um sorriso;
Há outras mais brutais que sem aviso
Matam de outra forma os que não morrem.

E há tanto do passado no presente:
Tempo, sonhos, árvores. pureza...
Há tanto adeus em nós a tanta gente!

Que fazer do fim, desta tristeza
Senão uma canção de estar contente
Por vivo ainda se ver tanta beleza?

Ribeira de Pena, 01 de Julho de 2015.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem foi colhida, com a devida vénia, no maravilhoso filme de animação "The Lighthouse" (2010), de Po Chou Chi.]



Cardíaco urbano (homem olhando certa mulher que passa na baixa de Coimbra)


A cada vez que te vejo
Regressa a taquicardia:
Não sei se é do desejo
De pensar no que faria
Se é por não haver ensejo
De te fazer o que queria.

Vila Real, 24 de Junho de 2015.
Joaquim Jorge Carvalho
[A imagem (da célebre Jessica Rabbit) foi colhida, com a devida vénia, na Wikipédia.]