National
Geographic
Ei-lo.
Reparai como, já bebida a latinha de cerveja e esgotado o maço de tabaco, atira
uma e outra embalagens para a estrada, num gesto cheio de cilindradas e ruído. É
o mesmo que cigarra, charuta ou cachimba sobre o vizinho de mesa, berra
convicções ao telemóvel (no Café, na sala de reuniões, na missa, no auditório
municipal) e, não necessariamente bêbedo, urina na rua, com a majestade e a
indiferença de uma vaca.
Também
o podem apreciar a acompanhar o cão, com paciência e método, rua acima e rua
abaixo, várias vezes esperando que o quadrúpede se alivie liquidamente contra o
muro de minha casa, ou solidamente no passeio público. Se interpelado, rosna
insultos e superiores explicações sobre a natureza biodegradável da
excrementação do seu Rex.
O
modo como conduz o automóvel é um atestado de virilidade, desesperado grito
contra a murcha desconfiança dos outros. Quase nos mata, nos troços quotidianos
da vida funcionária, ignorando limites de velocidade, traços contínuos ou
curvas sem visibilidade. Aprecie-se a jactância com que, na tasca de destino,
recorda mais um recorde de habilidade e lepidez.
Vê-se
bem que gosta de sentir o poder nas suas mãos. Bate, com devoção, na mulher e
nos filhos, nos adeptos de clubes adversários (mas só se eles estiverem em
inferioridade numérica). É profundamente racista e, embora despreze quase todos
os conterrâneos, afirma o seu patriotismo através da mais elementar xenofobia.
Política e psicologia desaguam no mesmo apotegma: se algo corre mal, a culpa é
fatalmente dos outros.
Critica
a lei e os juízes, se lhe limitam a concretização impune de impulsos e caprichos.
Mas declara o seu amor pelos tribunais, ao invés, se lhe validam os interesses
do egozinho, ainda que colidindo com algum pormenor ético ou moral.
Crê-se
um sobrevivente, e por isso olha de modo trocista para os românticos deste
mundo, esses que estranhamente sacrificam o conforto pessoal à noção de
justiça, de bem, de verdade, de lealdade. Na sua taxonomia pessoal, esta gente
lamentável caracteriza-se pela fraqueza e pela falta de tino. São (e di-lo com
claro desprezo) os totós, os panhonhas, os poetas.
Finalmente,
revela um ostensivo ódio à educação e à cultura. Despreza a arte mais burilada,
a Música maiúscula, o humor que obriga a pensar, a mariquice da poesia ou do
teatro. E, na maioria dos casos, embora se autoproclame catedrático do
desporto, não se dá ao incómodo de o praticar.
À
primeira vista, chamar-lhe-íamos porco, atendendo ao gosto que revela em
refocilar-se na porcaria que ele próprio produz. Mas, atenção, estamos na
presença de uma espécie mais complexa: é a besta. A famosa besta-quadrada.
Reproduz-se com preocupante facilidade. Anda por aí. É preciso cuidado,
leitores.
Vila Real, 08 de Julho de 2016.
Joaquim Jorge Carvalho
[Esta
crónica foi publicada no semanário O
Ribatejo, edição de 14-07-2016.]
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