sexta-feira, 12 de setembro de 2025

Teoria do Medo

 De aranhas

Conheço e desconheço o suficiente

Para não gostar delas;

Por não as conhecer bem

E por bem me conhecer

Vejo-as desde sempre como inimigas.


Na casa-de-banho, no topo 

Do canto direito (para quem entra)

No limite da parede, rente ao tecto

Avistei uma (de tamanho razoável):

Ataquei-a com um desentupidor

Pra a destruir

Mas ela voou dali

Misteriosamente

Para um recanto qualquer da divisão.

E por ali vive desde então

(Algures).

De modo que

De inimiga visível passou a invisível -

E eu nunca mais visitei a casa-de-banho

Com a tranquilidade orgânica

Do tempo anterior ao medo.


Setúbal, 02-07-2025.

Joaquim Jorge Carvalho



Voo não

 A árvore apita os ramos por acreditar

Que só voando será feliz.

Asifica-se por querer voar

E em vão luta contra a raiz.


Coimbra (Fórum), 12-07-2025.

Joaquim Jorge Carvalho

Sorriso de neto (2)

 O sorriso do infante

Voou e caiu no chão:

É um infinito instante

Que fica no coração.


Setúbal, 04-07-2025.

Joaquim Jorge Carvalho

Mãe & Flores

Quando nos morrem amores

Há, no devir dessas dores,

Episódios quase bonitos -

Por exemplo, eu comprar flores

Ao preço de cinco euritos;

Ponho-as no chão tumular 

Da Mãe, Sagrada Excelência,

Primaverando o lugar

Perfumando a sua ausência.


Coimbra, 22-06-2025.

Joaquim Jorge Carvalho

Sorriso do neto

 O sorriso do meu neto

Vai do chão até ao tecto!


Setúbal, 04-07-2025.

Joaquim Jorge Carvalho

sexta-feira, 25 de abril de 2025

25 de Abril de 1974: O Dia luminoso depois da escuríssima Noite


O 25 de Abril de 1974 significa, para Portugal, a conquista da Paz, da Liberdade, da Democracia e do Desenvolvimento. O Dia claro depois da longa Noite.
À época, a maioria dos países europeus com histórico de colonização já haviam aceitado a independência das (ex)colónias e estavam em paz; na Europa, a maioria dos países desenvolvidos tinham regimes democráticos e livres, invejados pelos povos privados desse privilégio; para fugir à fome e à irrespirabilidade da ditadura, os portugueses (muitos deles pobres, analfabetos, sem o mínimo conhecimento de línguas estrangeiras) eram obrigados a emigrar, descobrindo nos países de acolhimento oásis de riqueza e de liberdade – refiro-me a eleições livres, comunicação social livre da censura, escola para todos, assistência médica para todos, direitos dos trabalhadores, autoestradas, bibliotecas públicas, habitações dignas, saneamento básico.
Há quem, por ignorância, frustrações pessoais ou mera má-fé, se recuse a perceber esta evidência cristalina. Merecem-me pena ou nojo. É gente que cospe acusações patéticas por “51 anos de roubos”, “de corrupção”, “de insegurança”, “de cunhas”, como se os anos anteriores - de guerra, ditadura, miséria, polícia política, prisões arbitrárias, tortura, assassinatos, tribunais espúrios, eleições falsas, analfabetismo, emigração e exílio – tivessem sido maravilhosos (sem roubos, sem corrupção, sem insegurança e crimes, cunhas).
Sinto um profundo orgulho em ter sido contemporâneo do dia 25 de Abril de 1974 – e exorto toda a gente, agora, ao reconhecimento (limpo e justo) de uma dívida de gratidão aos que nessa data nos ofereceram o Futuro. Exorto em especial os jovens a tomar em suas mãos a defesa urgente da Liberdade e da Democracia, contra os salazarentos hodiernos, que espalham, sem vergonha nem remorso, a mentira, o racismo, o ódio e a intolerância.
25 de Abril sempre! Fascismo nunca mais!


Ribeira de Pena, 25 de Abril de 2025.
Joaquim Jorge Carvalho

[A foto, de JJC, foi tirada durante o dia 24-04-2025, em Ribeira de Pena, durante uma arruada muito alegre, muito participada e muito bonita, com cartazes, música e palavras de ordem intemporais.]


quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

Palavra(s) da salvação

 



Precisamos de beleza e de abraços
(Do fogo que nos salva da Má-Sorte)
Precisamos da força dos teus braços
Da tua vigilância contra a Morte.

Aquilo que ignoras ou que vês
O excesso ou a falta do que dizes
Faz-nos infelizes ou felizes
Salva-nos ou mata-nos de vez.

Por um gesto, um passo, uma acção
Somos a alegria ou a tristeza –
Não te esqueças de trazer o coração
Para a obra inacabável da Beleza!

Setúbal, 02-01-2025.
Joaquim Jorge Carvalho

Visão do eterno-concreto ( o poeta em modo de avô)


O avô olha o menino
E vê um futuro a haver
Num mundo cujo destino
Já ele não poderá ver.

O recém-nascido ri-se
No berço que a avó bordou –
É como se o bebé visse
A adoração do avô.

O avô vê no delfim
Algo eterno-concreto
E vê, ao vê-lo, que o Fim
Morre por nascer o neto.

Setúbal, 25-12-2024.
Joaquim Jorge Carvalho